sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Acendimento da Chanukiyá no Shabat!



Que velas acendemos primeiro?

Na tarde de sexta-feira, acendemos as velas de Chanuká um pouco antes das velas de Shabat. (No Shabat, o sagrado dia de repouso, é proibido acender uma chama). A chanukiyá não pode ser tocada ou removida depois do seu acendimento na sexta-feira e até sábado após o anoitecer. No sábado, as velas de Chanuká são somente acesas após o final do Shabat, depois da prece de Havdalá ser recitada. 


Shabat Shalom!


Chag Sameach Chanuká!

Pintura de Rosa Katzenelson


Hoje acendesse a 3ª vela

Fonte:


Uma História de Chanuhah!





Chanukah Menorah in Cascais   


25 Kislev 5774 - 28|11|2013


   Num subúrbio de Bruxelas, no meio da Segunda Grande Guerra, havia um pequeno garoto Judeu, de apenas um ano e meio e completamente sozinho.

Sua mãe estava escondida, clandestina, entre os membros da resistência, enquanto o pai tinha sido deportado para o campo de concentração de Auschwitz. O garoto estava na lista para ser deportado, juntando-se a inúmeras outras pessoas numa jornada para a morte certa.

  O presidente da câmara desta cidade decidiu que as coisas tinham de se desenrolar de outro modo. Depois de retroctivamente ter alterado a sua certidão de nascimento, o presidente acolheu este garoto como membro da sua própria família.
A filha do presidente, Elisabeth, e o seu marido, Charles, criaram este rapaz como sendo seu. Durante os cinco anos seguintes eles tornaram-se o seu Pai e sua Mãe.

Depois da Guerra e do regresso milagroso dos seus pais, este garoto tinha agora dois conjuntos de pais. A partir desta altura, juntamente com Yosef Yisrael e Cecyla, Elisabeth e Charles foram os pais desta criança.

Este pequeno garoto é hoje avô, vivendo em Cascais não muito longe desta Menorah.


A Menorah de Cascais, tão orgulhosamente erguida, é dedicada em memória destes dois conjuntos de pais.

Chanukah é o Festival da Luz, um período em que reconhecemos o poder de pequenas velas.

Quando somos confrontados por desafios, escuridão, dificuldades que parecem de solução impossível, é altura de aprender com a Menorah.

Não nos rendemos na presença de dificuldades mas procuramos sim oportunidades nessas dificuldades; oportunidade de acender uma chama, de ajudar outra pessoa, desse modo vagarosamente trazendo luz e esperança onde elas antes não existiam.

Como uma pequena vela ilumina uma tremenda quantidade de escuridão, um acto de compaixão tem um impacto enorme e duradouro, trazendo luz e mesmo vida para gerações futuras.

Cortesia do

Rabbi Eli Rosenfeld


chabadportugal.com

Feliz Chanukah e Shabat Shalom!


Finalizo este artigo com um agradecimento especial ao Rabino Eli Rosenfeld, pelo apoio incondicional que nos tem dado.


Muito obrigada. ZD

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Chanuká - Começa hoje, depois do Pôr-do-Sol...



Hoje começa o Chanucá


Acenda a primeira vela

A Festa de Chanucá, com oito dias de duração, começa esta noite. Em comemoração ao milagre do azeite acendemos as luzes de Chanucá – lamparinas de azeite ou velas – todas as noites durante 8 dias, aumentando o número de luzes a cada noite. 

(No calendário judaico, o dia começa ao anoitecer; esta noite, e assim inicia o primeiro dia de Chanucá).


Como acender a Chanukiyá e que orações recitar:

http://www.chabad.org.br/datas/chanuca/cha012.html



Chag Sameach Chanuká !



Fontes:



terça-feira, 26 de novembro de 2013

Um breve resumo da história do Chanukah





Pintura de Annie

A Ocupação Síria

Há mais de 2000 anos, o rei selêucida Antiochus III governava Israel. Ao princípio, ele tratava com bondade os judeus e concedia-lhes alguns privilégios; porém quando os romanos o derrotaram, Antiochus forçou os povos de seu império a fornecerem o ouro necessário para pagar os tributos romanos. O seu filho e sucessor, Seleucus IV, continuou com a opressão.



Mas o pior conflito causado pela ocupação síria de Israel veio de dentro, com o crescimento do poder dos judeus "helenistas", que adoptaram a cultura grega idólatra. 

Pintura de Wojciech Stattler





O Cohen Hagadol, Sumo-sacerdote, Yochanan, previu o perigo dessa influência. Enfurecidos por essa oposição, os helenistas tentaram fomentar o conflito entre o Rei Seleucus e Yochanan.




O Louco!

Entretanto, Seleucus foi assassinado e seu irmão Antiochus IV tornou-se rei. Um tirano cruel, Antiochus zombava da liberdade religiosa. Era chamado "Epifânio" (amado pelos "deuses"), porém um historiador contemporâneo, Polebius, chamou este rei perverso de "Epimanes", que significa "louco".


Esperando impor uma religião e cultura comuns, Antiochus negou a liberdade religiosa aos judeus, suprimindo a Lei da Torá. Ele instalou o irmão de Yochanan no seu lugar, o helenista Jason, como ele chamava a si mesmo em grego – passou a divulgar os costumes gregos no sacerdócio. No entanto, seu amigo helenista Menelau expulsou Jason. Enquanto isso, Antiochus empreendeu uma guerra bem-sucedida contra o Egito. 

Gravura de Gustave Doré


Roma exigiu que ele parasse, e ele cedeu. Em Jerusalém, nesse ínterim, espalharam-se boatos da morte acidental de Antiochus, e o povo rebelou-se contra Menelau, que fugiu.



Mártires


Antiochus soube da rebelião em Jerusalém; já furioso por ter suas ambições frustradas no Egipto, enviou seu exército atacar os judeus, matando milhares. Emitiu então decretos severos proibindo a religião judaica, confiscando e queimando Rolos de Torá. Guardar o Shabat, realizar a circuncisão e cuidar as leis dietéticas eram agora castigadas com a morte. Apegando-se à sua fé, milhares de judeus sacrificaram a própria vida.



Gravura de Luyken-Goeree


Matityahu...


Por fim, os soldados de Antiochus chegaram à aldeia de Modi’in. Construíram um altar na praça principal e exigiram que Matityahu, um sacerdote idoso e líder da comunidade, oferecesse sacrifícios aos deuses gregos. Ele recusou, professando a lealdade do seu povo ao pacto de D’us com Israel.


Quando um judeu helenista se aproximou para oferecer um sacrifício, Matityahu agarrou a espada e matou-o. Seus filhos e seguidores mataram muitos invasores e perseguiram os restantes, depois destruíram o altar. Matityahu sabia que Antiochus certamente enviaria soldados; então ele e um bando de seguidores fugiram rumo às colinas da Judeia.

Gravura de Gustave Doré



...e Filhos




À beira da morte, Matityahu conclamou a seus filhos para continuarem a sua luta. Um dos irmãos, Shimon "o Sábio", os guiaria; outro os lideraria na guerra, Yehudá, "o Forte" – chamado Macabeu, um acrônimo do hebraico "Mi Camocha Ba’e-lim Hashem" – "Quem é como Tu, ó D’us".





Antiochus enviou Apolónio para eliminar os Macabeus. Embora maior e mais bem equipado, o exército de Apolónio foi derrotado pelos Macabeus, que agora derrotavam uma tropa síria atrás da outra. Antiochus decidiu mostrar seu poder militar para esmagar o corajoso pequeno bando de judeus. Mais de 40000 soldados sírios foram enviados à luta. Após uma série de batalhas, os Macabeus venceram!


Obra de Giovanni Domenico Tiepolo
Os sete irmãos macabeus foram condenados à morte por Antiochus


Uma pequena ânfora


Em seguida, os Macabeus foram libertar Jerusalém. Tiraram do Templo os ídolos ali colocados pelos sírios. Construíram um novo altar, consagrado a 25 de Kislêv de 3595 (165 AEC).

Os sírios tinham roubado a Menoráh de ouro do Templo, portanto os Macabeus imediatamente fizeram uma nova, porém de metal menos nobre. Embora o azeite impuro pudesse ser usado para acender a lamparina do Templo se necessário, eles insistiram em usar apenas a única ânfora de azeite com o selo do último Sumo-sacerdote justo, Yochanan.



Pintura de Michoel Muchnik


Aquela pequena e única ânfora, contendo azeite somente para um dia, durou os oito dias, conforme comemoramos todos os anos: os Oito Dias de Chanucá.



Pintura de 
Mordechai Edel


Fontes:

domingo, 24 de novembro de 2013

Herança Judaica nos Açores.



A longa luta para salvar a Sinagoga de Ponta Delgada


Entrevista com José de Almeida Mello


Por Carolina Matos (*)

O historiador José de Almeida Mello é o bibliotecário responsável pela Biblioteca Municipal de Ponta Delgada e o adido cultural da Câmara Municipal de Ponta Delgada. Em 2003, a Comunidade Israelita de Lisboa nomeou-o coordenador da Comissão para a Restauração da Sinagoga dos Açores para supervisionar o projeto de renovação e conservação da Sinagoga Sabar Hassamain de Ponta Delgada.




A Sinagoga Sahar Hassamain é a única Sinagoga ainda existente no arquipélago e a mais velha das restantes sinagogas de Portugal. Foi estabelecida por volta de 1820, por um grupo de empresários judeus que migraram com suas famílias de Marrocos e se estabeleceram na ilha de São Miguel, no início do século XIX.

Foto:
A Sinagoga Sahar Hassamain em Ponta Delgada.


Nessa altura a ilha de São Miguel chegou a acolher quatro sinagogas em Ponta Delgada e uma em Vila Franca do Campo. Havia também um cemitério judeu na ilha e jazidas adicionais em São Miguel, Terceira, Faial e na ilha Graciosa.

A Sinagoga Sabar Hassamain foi consagrada por Abraão Bensaúde em 1836, e abandonada na década de 1950, após os últimos membros da comunidade judaica residente terem deixado a ilha. O último serviço religioso na Sinagoga teve lugar em 1966 com um grupo de soldados judeus estacionados na Base Militar dos EUA nas Lajes, na ilha Terceira, onde celebraram Yom Kippur.

Provisoriamente propriedade da Comunidade Israelita de Lisboa, o edifício está agora no processo de transferir a sua propriedade para a Câmara Municipal de Ponta Delgada para ser recuperado e transformado num espaço público.


O projeto de recuperação é o culminar de 30 anos de esforços para salvar a Sinagoga e preservar o legado judaico nos Açores. Nos últimos 15 anos, a Comissão para a Restauração da Sinagoga dos Açores tem trabalhado ativamente para avançar com o processo. A iniciativa conta com o apoio da Câmara Municipal de Ponta Delgada, com a comunidade local e a Comunidade Israelita de Lisboa, e nos Estados Unidos com a comunidade açoriana imigrante e a Harvard University.



José de Almeida Mello, um prolífico autor de variados livros e monografias, publicou Sahar Hassamain Sinagoga de Ponta Delgada (2009) um livro que conta a história da Sinagoga e fala da importância de preservar o legado judaico nos Açores.



Historiador José Almeida de Mello


Nesta entrevista para o Portuguese American Journal, Mello descreve o longo processo para salvar esse legado e fala das pessoas que se envolveram no esforço para inscrever a experiência judaica nos Açores, no contexto da história.


O que se sabe sobre a presença judaica nos Açores?

Falta-nos um estudo exaustivo relativamente à presença judaica nos Açores, mas sabemos que, com base em várias referências, muitos açorianos têm antepassados judeus. Sabemos, é um fato, que logo após os Açores terem sido descobertos pelos portugueses no século XV, muitas famílias judaicas se fixaram nas ilhas entre os muitos perseguidos pela Inquisição. Quantos eram e o que lhes terá acontecido precisa ser pesquisado. Um dos principais objetivos do projeto de restauração da Sinagoga é pesquisar o legado judaico nos Açores a partir do século XV, até à sua presença mais recente nos séculos XIX e XX.


Uma comunidade judaica estabeleceu-se nos Açores após 1818. Quem era essas pessoas?

Eram um grupo de industriais e comerciantes de Marrocos de origem sefardita e que falavam árabe marroquino e ladino. Os nomes de família, para citar apenas alguns, eram Bensaúde, Buzaglo, Aflalo, Amiel, Absdid, Zafrany, Abecassis, Adrahi, Benayon, Matana, Semtob, Bensliman e Delmar.


Como é que a comunidade judaica foi recebida nos Açores?


Devo dizer que nem sempre foram bem-vindos. Não com base na sua fé, mas porque eram comerciantes astutos que concorriam com o comércio local. No que refere à religião, na altura da sua fixação uma lei constitucional em Portugal proibia o estabelecimento de outras denominações religiosas que não fosse a Igreja Católica. Isto pode explicar o fato da Sinagoga de Ponta Delgada ter sido construída dentro de um edifício, numa residência, escondida do público.


Foto: Interior da Sinagoga


Entretanto, entre 1820 e 1826, Portugal viveu a Revolução Liberal que concedeu liberdade religiosa. Após o liberalismo se estabelecer, a comunidade judaica em Portugal, os Açores incluídos, obteve liberdade religiosa. O mesmo aconteceu com outras denominações religiosas, como a Igreja Anglicana, que existiu retirada do público mas que após o liberalismo gozou igualmente da liberdade religiosa.


A comunidade judaica expandiu e prosperou nos Açores durante mais de um século, mas depois desapareceu. O que aconteceu?


A comunidade judaica nos Açores nos séculos XIX e XX era pequena. Porque as ilhas estão geograficamente afastadas, progressivamente essas famílias judaicas optaram por se fixar em Portugal Continental e outros países. Alguns casaram fora da religião, converteram-se ao catolicismo e foram assimilados na sociedade. Atualmente, apenas um indivíduo nos Açores, Jorge Delmar Soares, afirma professar a fé judaica. No entanto, os descendentes dessas famílias ainda têm uma forte ligação aos Açores. Um exemplo é a família Bensaúde, donos do Grupo Bensaúde fundado em 1820, que ainda hoje é o maior grupo económico nos Açores e um dos maiores grupos económicos em Portugal.


Qual é a importância do legado judaico?


A presença judaica faz parte da nossa memória coletiva, tanto da comunidade judaica como da comunidade açoriana. Apesar de serem um grupo pequeno, de cerca de 200 indivíduos, foram muito ativos em várias ilhas onde estabeleceram as suas empresas, mantiveram as suas tradições e praticaram a sua religião. Eles geraram também uma enorme riqueza e deixaram um importante legado cultural. A Sinagoga, os documentos e artefactos deixados para trás, juntamente com os cemitérios, são referências culturais relevantes tanto para a história dos judeus como para as comunidades locais.


Quando foi que se envolveu neste processo?


Em 2000, durante uma viagem a New Bedford para visitar minha avó, fui contactado por Alfredo Alves de Fall River. Não o conhecia e nunca tinha ouvido falar da Sinagoga de Ponta Delgada. Tinha acabado de me formar pela Universidade dos Açores, com uma licenciatura em História, e estava à procura do meu primeiro emprego. Em 1980, Alfredo Alves foi co-fundador do primeiro grupo formado nos Estados Unidos para se recuperar da Sinagoga. Ele expressou-me a sua frustração e a preocupação com o estado de abandono da Sinagoga e pediu-me para me envolver. Eu disse-lhe que não estava em posição de ajudar.



No entanto, duas semanas depois, consegui o meu primeiro emprego como o adido cultural da Câmara Municipal de Ponta Delgada. Uma das minhas primeiras iniciativas foi a visitar o local onde fiquei chocado com o estado de decadência que encontrei e resolvi tomar a iniciativa. Primeiro, entrei em contato com os meios de comunicação locais para sensibilizar a opinião pública para a situação. A seguir, procurei conseguir apoio financeiro para estabilizar o processo de decadência.




Graças à generosidade do Dr. António Castro Freire, um membro da família Bensaúde, Christiane von Frefrau Schurbein, uma cidadã alemã residente em Ponta Delgada, e do Grupo Marques, uma empresa de construção local, o prédio recebeu um novo telhado, novas janelas, portas e uma pintura exterior.


Por mais de 30 anos foram feitas várias tentativas para salvar a Sinagoga e o legado judaico nos Açores. Quem mais se envolveu neste esforço?

A primeira tentativa foi feita em 1980, por um grupo formado em Fall River, Massachusetts. Em 1988, o grupo criou a Azores Synagogue Restoration Committee  com o objectivo de angariar fundos para recuperação da Sinagoga,  mas o seu objetivo nunca foi materializado. Em 2003, depois da Comunidade Israelita de Lisboa se envolver no processo, um novo grupo, o foi formado em Ponta Delgada. Fui nomeado o coordenador desse comité, encarregado do projeto de recuperação da Sinagoga. Outros membros incluíam Fátima Sequeira Dias, Jorge Delmar Soares, Isabel Albergaria, e António Bensaúde Castro Freire.

O primeiro passo, da Comissão para a Restauração da Sinagoga dos Açores foi iniciar a transferência da propriedade da Comunidade Israelita de Lisboa, para a Câmara Municipal de Ponta Delgada. Dai resultou que em 2009 a cidade ganhou uma concessão de 99 anos sobre o prédio em troca de providenciar fundos para a sua renovação. Como parte do esforço de recuperação, em 2009, publiquei o livro, Sahar Hassamain Sinagoga de Ponta Delgada, disponível em inglês e português.


Em 2012, fui também co-fundador da Associação Cultural Amigos da Sinagoga de Ponta Delgada com Jorge Delmar Soares e Nuno Bettencourt. Cerca de 115 pessoas foram então convidadas a aderir, a nível local, nacional e internacional, com o objetivo de assegurar uma ampla base de apoio ao esforço de recuperação da Sinagoga. Também em 2012, a organização irmã, Azorean-Jewish Heritage Foundation, foi criada em Massachusetts, presidida por Gideon Gradman, o tesoureiro Donald Berube, a secretária Lisa Rosen e os diretores Paula Raposa, Michael J. Rodrigues, Robert Waxler e Pedro Amaral. O objetivo é apoiar o projecto de recuperação por meio da angariação de fundos nos Estados Unidos.


Por que demorou tanto tempo a organizar o projeto de recuperação?


Durante muito tempo não era claro quem eram os proprietários do prédio. Isto criou uma questão jurídica combinada com falta de liderança e falta de vontade política. Somente após a Comunidade Israelita de Lisboa ter assegurado o título da propriedade, foi possível estabelecer uma parceria com a Câmara Municipal de Ponta Delgada.



Devo dizer que o impasse criou um longo período de abandono ao qual o público não ficou indiferente. Entre aqueles que manifestaram a sua preocupação e tomaram medidas esteve o jornalista António Valdemar e a historiadora Fátima Sequeira Dias. Foram eles que mantiveram o público informado e alertaram para a relevância histórica do legado cultural judaico nos Açores e para a importância de preservar esse legado.



Eu fui uma das pessoas que foram alertadas. Cheguei a estar tão preocupado que decidi intervir por iniciativa própria. Passei inúmeros dias, muitas horas, varrendo e limpando o pó e recolhendo material deixado em caixotes, arcas e no lixo. Recolhi e guardei dezenas de itens para serem estudados e catalogados.





Também organizei visitas guiadas ao local com turistas, estudantes e pesquisadores. Em 2010, organizei uma exposição na Biblioteca Municipal de Ponta Delgada onde foi exibida uma variedade de itens encontrados no local. O objetivo foi de alertar o público para a importância de salvar o nosso legado cultural judaico.



Pode descrever o local? O que é que encontrou?

A Sinagoga está encoberta dentro das paredes de um edifício situado na Rua do Brum 16, no centro de Ponta Delgada. Por fora, o edifício parece-se muito com uma habitação típica de uma família açoriana do século XIX. Mas no interior tinha múltiplas finalidades. Servia de residência privada do rabino, funcionava como centro comunitário e abrigava a Sinagoga. O centro comunitário oferecia aulas de arte, aulas de hebraico e aulas de Torá. A Sinagoga ocupava uma grande área retangular, bem iluminada por duas janelas voltadas a norte. Ali tinham lugar os serviços religiosos, os rituais fúnebres, os casamentos e as circuncisões.


O Santuário é muito bonito, com a Arca e pódio, e duas fileiras de cadeiras laterais. Foram encontradas duas arcas cheias de uma mistura de manuscritos hebraicos, livros, roupas e objetos pessoais. Infelizmente, alguns móveis e alguma madeira foram contaminados com térmitas. A área também está infestada por ratos, aranhas, baratas e traças. A pedido do Dr. Joshua Ruah, da Comunidade Israelita de Lisboa, alguns móveis e artefactos religiosos foram removidos temporariamente; especificamente as quatro Sefer Torá, dois vasos cerimoniais, a cadeira de circuncisão e dois candelabros.





O seu livro, Sinagoga Sahar Hassamain de Ponta Delgada, é um livro que conta toda esta história. Por que o escreveu?

Escrevi o livro na altura em que aqueles que se tinham envolvido se sentiam desanimados. O objetivo era contar a história Sinagoga, ilustrar o estado de decadência do prédio e chamar a atenção para o perigo iminente de perder o valioso legado cultura. O lançamento do livro foi um SOS urgente e também um apelo para que se tomassem medidas. Pessoalmente, estava prestes a desistir do projecto quando o evento ocorreu a 13 de março de 2009, simbolicamente no Hotel Marina Atlântico, propriedade do Grupo Bensaúde.

Numa reunião que tivemos naquele dia, eu disse que estava pronto a devolver as chaves e sair do projeto se não se tomassem medidas. Foi um ponto de viragem. Lembro-me do momento em que se formou o consenso. Eram seis horas da tarde, quando todos concordarmos que a Sinagoga seria salva. Foi um momento histórico, com todas as forças a convergirem no esforço comum para avançar com o projeto.


Logo a seguir, teve lugar num encontro entre a ex-presidente da Câmara, Berta Cabral, e José Carp, da Comunidade Israelita de Lisboa. Um memorando de entendimento foi elaborado para transferir a propriedade do edifício da Comunidade Israelita de Lisboa para a Câmara Municipal de Ponta Delgada. Foi acordado que a Câmara iria liderar o projeto de recuperação com o objetivo de transformar a Sinagoga num espaço público. Desde então, temos feito muito progresso. Devo reiterar que o livro foi publicado gratuitamente, pela Nova Gráfica de Ponta Delgada, e que as receitas vão para o fundo de recuperação Sinagoga.



Pode descrever o projeto de renovação?


O principal objetivo é preservar o valor histórico da memória comum partilhada tanto pela comunidade açoriana como pela comunidade judaica. O plano é recuperar o prédio, restaurar o Santuário e criar um museu para preservar a herança cultural encontrada no local. Um centro de interpretação do legado judaico nos Açores será criado juntamente com uma exposição permanente, um arquivo e uma biblioteca incluindo uma coleção particular doada por Patrícia Bensaúde. Este espaço irá fazer parte do patrimônio cultural da Câmara Municipal de Ponta Delgada.


Como tem progredido o projeto de renovação?

Os últimos inquilinos deixaram o prédio na década de 1950. Em 2003, após mais de 50 anos de abandono, alguns trabalhos de manutenção foram feitos para estabilizar o edifício. Atualmente estamos a reunir os esforços das duas organizações irmãs formadas nos Açores e nos Estados Unidos com instituições públicas e privadas de ambos os países.


Em parceria com a Câmara de Ponta Delgada e a Comunidade Israelita de Lisboa, estamos a elaborar um plano de recuperação que inclui angariação de fundos, desenvolver o conceito do museu, catalogar o inventário e reconstruir. O processo já começou e está a progredir bem. A angariação de fundos está neste momento a crescer. O arquiteto açoriano, Igor França, é o responsável pelos detalhes do projeto de renovação. Através do esforço do Senador de Massachusetts, Michael Rodrigues, especialistas do Centro de Estudos Judaicos, da Harvard University, já se comprometeram a avaliar, identificar e catalogar o inventário.



Exposição na Biblioteca Municipal de Ponta Delgada



Quando é que o projeto fica concluído?

Esperemos que, se tudo correr conforme o planeado, o projeto seja concluído até o final de 2014 ou no início de 2015. Será uma ocasião especial, um dia de glória para todos os amigos da Sinagoga Sahar Hassamain de Ponta Delgada. Será um momento memorável na nossa história comum, honrar e celebrar a herança cultural judaica nos Açores.


Quem deve ser contactado para questões relacionadas com donativos on-line?

Para obter informações sobre como contribuir com donativos para a restauração da Sinagoga Sahar Hassamain podem contactar-me diretamente, josemello@lmpdelgada.pt, ou entrando em contato com Pedro Amaral, pedro.amaral @ masenate.gov, através do escritório do Senador Massachusetts Michael Rodrigues. Tanto Pedro Amaral como o Senador Michael Rodrigues são membros da Azorean-Jewish Heritage Foundation, e dos Amigos da Sinagoga de Ponta Delgada.


 Será que a Sinagoga Sahar Hassamain Sinagoga de Ponta Delgada vai fazer parte do recém-criado projeto Sefarad Route dedicado a revitalizar os locais históricos judaicos em Portugal?



O projeto Sefarad Route foi lançado em Portugal em parceria com a Espanha e um grupo com sede na Noruega com a missão de atrair turistas da diáspora judaica interessados em visitar locais históricos judaicos em Portugal. Com o apoio dos nossos parceiros, a Comunidade Israelita de Lisboa, esperamos poder incluir Ponta Delgada na rede de cidades com presença judaica em Portugal.


(*) Carolina Matos é a fundadora e diretora do Portuguese American Journal on-line. De 1985 a 1995 foi diretora do mesmo jornal em edição impressa. De 1995 a 2010, foi consultora da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD). Carolina Matos detém uma Licenciatura e um Mestrado em Inglês e Educação pela Brown University (EUA) e um doutoramento em Educação pela Lesley University (EUA).



Ver restantes fotografias no site da fonte deste artigo, que 
 foram gentileza da Biblioteca Municipal de Ponta Delgada


Este artigo teve a autorização de Carolina Matos